quinta-feira, 26 de julho de 2018

TALVEZ O VENENO TENHA SIDO DEMASIADO!

Às vezes,
ferve meu sangue ainda
em convulsa raiva,

aguça meu coração
e se me apodera uma grande vontade
de fugir, sem deixar rastros
ou fumaça,

imponho-me
o silêncio, para não confundir
os anjos que ainda sonham neste mundo
sem graça:

mas, daquela
víbora indecifrável e indescritiva,
o que mais se firmou em mim
foi mesmo uma saudade
tal

que me deixou
mais parecido com algo qualquer
que, todos os dias, já amanhece
morto!

TRISTE FIM DE UM SONHO IMPOSSÍVEL!

Tu querias tudo certo,
como se eu fosse um anjo
e não um homem,

tu querias
todos os pontos nos is,
em mim a nobreza de um rei
e a sublimidade de um anjo;

tu querias,
e tu te tornaste escrava
do que tanto querias, transformando-me
em um mito que nunca fui:

assim foi que
morremos lentamente, com o veneno
que nos enfraquecia
aos poucos!

ELA DORME, E EU NÃO ME SINTO BEM!

Eu me transformei
na própria noite,

num fracassado
pescador de ilusões perdidas,

sem seu mar,
num deserto de miragens
secas,

num triste arremedo
de poeta

que por aqui
vaga, já morto!

O FIM!

Agora que tudo realmente
terminou,

não nos culpemos
um ao outro por nada mais;

porque, independentemente
do que nos fizemos,

cada um é inalienavelmente
responsável

somente pelo que de si
permitiu sair

em luzes, sombras
ou chuvas verborrágicas;

e isto já basta, com sobras,
para nossas mortes
de asas.


SEVEROS JUGOS

Já fui elucubrado,
julgado e condenado de modo prolixo
tantas vezes que perdi
a conta,

e em todas
houve algum tipo de reação,
mesmo que silente, de meu indecifrável,
escudeados e senciente
ego.

Mas quando fui elucubrado,
julgado e condenado por mim mesmo,
diante de um fiel
espelho,

senti-me um nada
cósmico, um menos que pedra ao chão,
um menos que poeira
ao deserto;

em cruciante dor
de me perceber a abnormal condição
para cometer vastas
violações

e para promover
o suicídio das coisas, das casualidades
e até das demais sencíências
– alheios –,

com minhas clarezas
abstratas, espúrias e ilusórias
(re) inaugurações.

AS IMAGENS SÃO UMA INCONTESTE PROVA DE NOSSA ABNOMALIA!

Queria poder
conseguir ignorar as avalanches de imagens,
advindas de caminhares incautos
e estúpidos;

e encontrar algum
lugar incomum, onde pudesse
descansar minhas laivas sombras, meus sortilégios
côncavos, minhas porras
leiteiras

e meus hábitos de,
a tudo isso, colocar sob incomensuráveis
e esplêndidas máscaras, tingidas
de faustos brilhos e verdades
dissimuladas.

O CANTO DO ROUXINOL!

Tu nunca estarás pronta
para ouvir o canto de um verdadeiro
rouxinol às outonais
manhãs,

sem lhe calinizar
os fulcros, as asas e as garras
com tuas sublimes fluorescências
neon!

UM ANJO ENTRE OS CORVOS!

Ela anda entre corvos
com a insana mente à toda

e com um sorriso tão
pueril à boca,

que ofusca
o próprio sol, enquanto sua alma

se macha de estanhas
sombras!

A POESIA EXIGE INSPIRAÇÃO!

O desejo
e a concupiscência
são poesias?

Se são,
deve ser por isso que tantos
passam suas vidas
fodendo

– de galho em galho –;

e, entre um e outro
momento de descanso, vão respingar
os resíduos de suas porras
sacras,

em versos tão comuns
como pífios!

segunda-feira, 16 de julho de 2018

VIL EXISTÊNCIA!

Certamente
que podes ter de tudo
quanto queirais nesta vã
e vil existência

- inclusive
jogares tuas culpas e pesos
às incautas costas
dos outros –;

afinal de contas,
é tua a particular senciência
para criares e para lidares,
a teus modos

e por tuas escolhas,
com tudo que – aprazendo-te ou não –
ao ego te sirva:

ora amando
anjos, pássaros e sapiens
puristas em paraísos
figurados,

ora debatendo-se
com demônios, vermes
e ratos aos chãos
enlameados,

ora abrindo-te
as asas e as pernas para que
qualquer um deles te coma
a vulva extasiada!

NUVEM BRANCA!

Porque
não nos é possível
estarmos sempre na mesma
nuvem branca,

porque
não nos é possível
bebermos sempre no mesmo
cântaro de vinho,

porque
não nos é possível
andarmos sempre na mesma
estrada pavimentada,

porque
não nos é possível
sequer nos tropeçarmos nas mesmas
pedras afiadas,

é que precisaríamos
nos amar sem elucubrações nem porquês,
para que não nos percamos
as asas.

CERCADO PELO DESERTO!

O deserto
me cerca de todos os lados,
corroendo-me com
ferrugens

de vazios
e nadas; quase que
se me apagando, inclusive,
o pouco que sobrou

dos pueris
dezembros e natais,
em minha perdida infância
passados.

ILUSÕES

Por que
ainda haveria de lhe dizer

ou de nos conjecturar
juntos em algo,

se tudo está
construído, inexoravelmente,

sobre uma tênue ponte
de alicerces falsos?

TARDE MONÓTONA

Cheguei a casa
aporrinhado naquela tarde,
empalideci de imediato seu sorriso,
fechando-lhe as portas
e as janelas;

dirigi-me a
meu pequeno quarto,
onde havia livros, um som, uma cama
e quase mais nada;

mas havia,
dentro dos livros, estórias de mundos,
e havia a música que se derramava
em tudo, sem ocupar
espaço;

e eu ali
tentando me salvar
de todas as coisas e de tudo
que semeavam fora os grandes
sapiens sencientes;

e o pior,
tentando me evitar
também o iminente naufrágio
de todas as coisas e de tudo
que se me confundia
dentro.

DOR E ANGÚSTIA!

Por que motivo
me livraria da dor e da angústia
de meu árido e silente
deserto,

se elas ao menos
me inspiram essas tristes,
amargas e tortas
poesias;

enquanto os pássaros,
as borboletas e as mariposas
só me levam aos lugares
comuns

de suas fluorescências
cegas?

quinta-feira, 12 de julho de 2018

ESTÁ FRIO!

Eu me lembro de ti
nesta tarde amarga e fria,

eu me lembro de ti,
dos tempos em que eu não temia
por grandes perdas,

eu me lembro de ti,
do teu cabelo liso e negro,
do teu olhar de brilho seco,

eu me lembro do teu rosto pálido,
dos teus seios acesos,
da tua vulva mágica,

eu me lembro de nossos sonhos,
eu me lembro de nossos pesadelos
e eu me lembro que combinamos de nos amar
eternos:

eu acho
que eu estou certo quando
digo que “Não vou aguentar viver

muito mais tempo sem ti!”

OS INDOLENTES!

… sonhar nuvens impossíveis,
desejar corpos longínquos e intocáveis,
querer eternizar amores proibidos,

tudo pode,
tudo vale,
enquanto não se está morto

para viver
com mais audácia e intensidade,
sem se sufocar demasiado

no fundo do rio!

ESSÊNCIA FINAL!

… essa tua lentidão
habitual tornou-se insuportável,

porque
agora meu tempo se tornou
muito breve,

e o que eu quero
comer do teu fruto e beber da fonte
sagrada de entre
tuas pernas,

enquanto,
ainda saudável neste mundo
de delírios e de imagens, tu manténs
tua aura fugitivamente sensual

e morna!

EU TE FALO COM VERSOS!

… na presença sagrada
em minha mente, quando me vens
à lembrança,

agora que
não podes mais por ti mesma
seguir,

eu ainda te darei,
pelo pouco de eternidade que me restou
por quanto viver,

o meu amor,
os meu versos rebelados,
os meus sonhos mais purificados
e os meus desejos mais
bem guardados,

até que meus ruídos
também deste mundo se calem!

JÁ NÃO ME ACHO EM NENHUM LUGAR!

Vê, Flor de inverno,
já não cabe neste escuro espaço
e em meus versos mal
traçados,

a saudade,
a angústia
e os moucos gritos de dor,

que em mim
se implantaram depois que
tu te foste, sucumbida à desgraçada

e impiedosa morte!

EU TE DEI TODO O MEU POSSÍVEL!

Eu ainda ouço
teu pedido de ajuda
pela dor de teres de viver num mundo
formado por espetaculares
imagens,

eu ainda sinto
a tua angústia em tentar viver
um amor sem-imagens,

eu sinto muito
que não tenhas entendido
nem meu amor, nem minha loucura,
nem minha incensatez:

eu realmente
sinto muito que, antes de morreres,
te rendeste às vozes das cidades

e dos mitos do mundo!

NÃO FUI EU QUE ME FIZ HUMANO!

Não fui eu
que me fiz humano,

fui jogado
no mundo assim;

então,
como meus irmãos que se dizem
mais puritanos,

quando
me lanço com minhas
asas inválidade,

só vario o lugar
e o modo, mantendo todas
as possibilidades

no sonho,
na fantasia,
no amor,

na dor,
no desejo
e no consequente naufrágio!

AMOR PERFEITO!

Sem distinção
de preferências, de opiniões,
de desejos, de sonhos, de fantasias
ou de loucuras,

o amor só é
deveras sincero e sagrado
se os dois amantes compuserem

com um só pulsar!

DE QUE ÉS FEITA?

De que és feita,
que me faz ficar trincado assim
em tão poucos segundos?

De sol?
De luz?
De chama?

De sombra?
De poesia?
De ternura?

De sensuais impulsos?
De deliciosidade seminua, com sua calcinha
mostrada como branca margarida?
De amor, com tudo no segundo

em que nos amamos?

A BIPOLAR!

De saudade,
de angústia, de dor e de sofrimento,
chamo-te Lilith,

a quem outrora
conheci em seu inferno humano
e sarnento;

por amor,
depois de morta, chamo-me
de A Flor do Inverno, com verdadeiro
sentimento, em poesia
e emoção!

EU JÁ PERDI GRANDES AMORES!

Sobram apenas dor,
estilhaços e lágrimas salgadas

de um amor
dito infinito que se perde

por qualquer laço nu,
por qualquer corpo cheio de curvas
e delícias ou por outra coisa
que nos cause êxtase
e vício!

SER!

… até que enfim
encontrei meu destino: ser.

Ser dos desertos
(mesmo de desertos casados)
oasis de amor e de desejo),

ser o alvoraçar
e o quebrar de asas inválidas,
atiçadas pela esplêndida imaginação
sapiens,

ser o suspiro do orgasmo
e o murmúrio das nuvens, das chuvas
e das angústias,

ser o alívio da dor
e a dor da flor que se desespera
ilegítima:

ser, condenadamente,
o tudo, o nada e o louco vasto
que ocorre nos ocos silências
e nas esquinas quebradas!

FUGA!

… quando a noite chega
e os girassóis se tornam negros,

vazadamente por vazios
e frias brumas,

só uma flor
com o coração sublime e a alma
limpa

pode lhe
oferecer algum caminho

de fuga!

VIVER :AOS OLHOS FUNDOS DE UM NIILISTA!

… viver
é ter o grandíssimo azar

de ter vencido uma acirrada
e fatal corrida, entre outros duzentos
e cinquenta milhões

e, como prêmio,
ingressar na virgem natureza
das coisas,

estuprando-as
como um sapiens abnormal!

NA AUSÊNCIA DE TEU CORPO!

Nas sombras da noite,
no ritmo dos neons e das mariposas,
silencio-me no poço,

dispo-me,
invoco-te à mente,
alvoroço-me por tua carne
e por teus ossos;

e em meio
a lembranças de fragmentos passados
e a tua eternal ausência,

violo-te e te amo
mais uma vez, com excitantes toques
na rija navala,

cada vez mais rápidos,
mesmo em tuas águas já mortas,
até se consumar um enlouquecedor
orgasmo!

sábado, 7 de julho de 2018

ELA E O MENSAGEIRO!


A CINZA AINDA ESTÁ QUENTE!

Conseguite,
seduziste-me ao me falares
de sonhos, de desejos e de amores
eternos,

ao me abraçares,
ao me beijares e ao andares comigo
por paraísos encantados e por vales
assombrados:

acendeste-me
em descontrolável fogo, fazendo
com que minha haste se esticasse
na calça como uma tenda;

e eu me rendi ali,
naquele exato momento, perante
tua beleza, perante a  perfeição
de teus gestos e de tuas
curvas,

ajoelhado
e com a boca, deliciando-me

em tua vulva molhada!

NÚPCIAS


ERIÇADO!

Confesso
que fiquei eriçado e todo arrepiado
quando te vi ali naquela
piscina,

com sinais
de alguns mínimos pelinhos
descapados da beira
do biquíni,

com os seios
formando uma covinha
sedutoramente
linda

e com a calcinha
penetrando sua deliciosa

bundinha!

FEITO UMA NAU DO NADA!

Como eram lindos
aqueles teus negros olhos
de vigília!

Como era sedutora
aquela tua jovem e irregular
geografia!

Como era incontida
aquela tua louca e faminta busca
por sabedoria!

Como te parecias
com um pálido anjo necessitado
quanto te despias!

Como destruías
todos os sonhos, todas as imagens
e todas as esperanças
que criávamos,

como era mortais
 as tempestades que, por causas dseins alheias,
em todas os fins de tarde,
com as quais

te vestias!

AINDA ME LEMBRO!

Ainda me lembro bem,
depois que ela partiu para longe
escreveu-me uma carta
de amor,

sua caligrafia estava
trêmula e me  cheirava, já naquela
minha tenra idade, amor
e poesia:

naquela carta
ela falava de uma dor de saudade
suada, devido ao grande amor
que tivemos em alguns dias
de verão.

Vez em quando,
hoje, ainda me pego em silêncio
com algumas lágrimas descendo
aos olhos

e imaginando
que, se fôssemos mais fores e mais adultos,
ainda poderíamos hoje, e eternamente,

estarmos juntos!

quinta-feira, 5 de julho de 2018

PALAVRAS VOLÁTEIS


Não creias
as palavras voláteis
e os versos mal traçados
do poeta niilista,

nem trilhes
pelos caminhos que o cão traça
por entre os palcos
da vida;

porque dizem por aí
– e constato –
que eles são cheios de sonhos,
pedras e precipícios.

ILUSÕES TRANSITIVAS


Por que te preocupas
em entender-me, flor de inverno,
se de onde te encontras
não te és possível,

ou por outra,
por que não congelas
meus versos, para os leres
quanto também não mais te houver
mais ilusões transitivas,

para quando também
não te repousares o dissimulado olhar
em outra direção, que não seja
a de teus próprios passos
perdidos?

FLAMEJANTE EGO


Vejo que
és perspicaz ao analisares
minhas poesias,

e concordo
plenamente com isso,
e concordo mesmo que elas
sejam piores que comer
jiló aos domingos;

mas podes
te surpreender quanto
ao que mais demonstraste gostar
com teu flamejante
ego:

minha mente
é tão insana que pode fazer
balançar tuas maiores
loucuras.

SILENTE MADRUGADA


Próximo aos 45,
como já não fazia há muito tempo,
levantei-me de minha insônia
e me fui a caminhar pela silente madrugada,
à avenida sombriamente deserta,

tal como quando era uma criança
que, entretida em caçar passarinhos com seu bodoque,
perdeu-se na mata escura,
com a impressão de que havia um monstro
ou um demônio a lhe perseguir,

tal como naquela ocasião
pelejei contra a maldita visagem
em angustiosa correria que não parecia
ter mais fim;

temi, apavorei-me e quis
correr, fugir, ter um par de braços a me abrigar,
ou uma mão que seja para tocar
e me resgatarem o mais breve
possível

– mas não olhos, olhos não,
nem semblantes, semblantes não,
que todos os olhares e todos os rostos
seriam demoníacos naquele,

mas, depois de um tempo,
extremamente cansado, esquálido e ébrio de sentidos,
olhei para todos os lados
por entres as casas, as esquinas e os vultos
fabricados pelas luzes
de neon,

e percebi novamente
que eram tão somente meus terríveis fantasmas
que sempre me acompanharam
deste quando me habitava
em puro templo.

terça-feira, 3 de julho de 2018

ALÉM DA MARGEM!

Abandonado
em um oceano seco,

entre à morte
ainda com aquele sinistro
sofrimento por amor,

jogado nas escuridões
nas mais frias noites:

quando tentei
me desviar da Flor de inverno,

caí nas agudas
garras da branca nuvem,

já estava
todo quebrado perante
o ultimo e solitário
horizonte!

INSUFICIENTES IMANÊNCIAS!

Escrever poesia
é como amar e meter,
não é nada inocente:

no entre imagens
dos sonhos, dos amores
e dos prazeres,

as verdadeiras
nuvens e as verdadeiras sombras
não mudam de forma
ou de cor:

nós é que
as margeamos na existencial
ponte!

ETERNIDADE!

Ando com tanta
vontade e tao desejoso
de me plantar, de alguma forma,
no infinito

que nem as dores,
nem as angústias e os sofrimentos,
nem os tempestuosos mares,

nem os constantes
e seguidos tropeços e sofrimentos
pelos quais tenho passado
nesta vida,

nem a iminente hora
da morte conseguem evitar
meus delírios dementes!

ABISMO

Somos bipolares,
sempre divididos em duas partes,

uma que sonha, outra que sofre,
uma que se dá ao mundo,
outra que quer devorá-lo,

uma esperança eterna
à beira de um definitivo naufrágio,

uma graça,
um pecado, um amor
incontido rancor, o alívio,
a dor:

sim, em tudo somos ambíguos
e bipolares esceto quando caímos no abismo
de nós mesmos, porque deste
não se sai vivo!

INESQUECÍVEL DEVANEIO!

Já nem me lembro
do que seja um fluxo de sublime
amor à nuvem:

exatamente,
é preciso reconhecer,
agora que estamos realmente
a caminho do fim,

que tentamos cultivar asas,
sem jamais conseguirmos deixar
de sobrevoar abismos
e precipícios,

e que, realmente,
não creio que nossas ausências
nos sejam mais dolorosas
que nossas ácidas
chuvas;

mesmo assim,
amo-te de um estranho e louco amor,
sem que, incautamente,
jamais te tenhas percebido
do essencial:

era-nos necessário não só o amor,
mas também o respeito, a dignidade
e uma duradoura paz
ao onírico leito

para nos anestesiarmos,
de mãos dadas,
das angústias e das dores
do mundo.

NUM LONGÍNQUO CREPÚSCULO!

Num longínquo crepúsculo,
ele se sentou nunca cadeira de mogno
e começou a enrolar, lentamente,
seu cigarro de palha:

as mãos calejadas
pareciam ter se transformado
em rijos e estranhos cascos,
com seus tentáculos cansados;

à pele envelhecida,
corriam tantas falésias
que lhe encobriam estórias
e nativas sardas.

Ele gostava ver o pôr-do-sol
dando baforadas
como que a assistir às últimas
luzes do espetáculo,

como que a me ensinar
como são frágeis
as cortinas de fumaça.

EU SEMPRE TE REPARAVA

Ainda me lembro
de quando estavas ali,
despercebida

– entre flores e cravos –;

ao longe,
teus lábios faziam
graciosas curvas sem que dissesses
uma palavra,

tuas pétalas
bailavam ao vento,
fazendo-me sonhar a nuvem
protegida.

Estranhamente
já se me tornavas vital,
mesmo antes que te percorresse
as sensuais margens,

e me naufragasse na puerícia
de tua alma.

ETERNAS AUSÊNCIAS!

E agora,
com ambos ausentes,
tu e eu:

que horizontes
merecerão teu olhar
angelical;

e que falésias
abrigarão, do cão,
as sombras
e o pau?

CONTRASTE!

É visível
que não gostam
– esses mascarados puristas
de plantão –

de quando
me aproximo demasiadamente
de suas apresentações
maestrinas:

tremeluzem,
alguns menestréis franzem
as sobrancelhas
em ira;

algumas mariposas
jogam os cabelos para trás,
fingindo desdém.

Às vezes, curvam-se
o raso chão,
atirando-me pedras verbalizadas
contra as sombras

– em vão –,

e revelando que,
por detrás dos disfarces,
há exatamente que estou ali
para evidenciar:

a verdadeira
– ou dela a falta –
face.

NOITE INESQUECÍVEL

Chegara de madrugada
em casa,

perfumado com o cheiro
e arranhado com os espinhos
de uma fulga flor
de inverno

– ela entendia mesmo
sobre chãos
e era uma fulgurosa puta
na cama –;

ao portão,
esperava-me um corpo cansado,
olhos lacrimejantes
e suaves mãos,

para curar-me as feridas
e ensinar-me,
dolorosa e silentemente,
sobre o amor e as sublimidades
do coração.

segunda-feira, 2 de julho de 2018

REPÚDIO


Não sou poeta
para me compararem
com os tais,

os açulados
bam-bam-bans da vida
ou da morte,

do amor
ou do dissabor, do lampejo
ou do desejo;

sim, não sou
como os poetas com suas tantas
máscaras mágicas,

que sabem tudo
sobre ipês, jacarandás e glicínias, que conhecem
tudo sobre sonhos, fantasias
e insânias incontidas,

e que grafam
(sobretudo em túmidos versos) seus egos
às tênues e exíguas luzes
das lamparinas.

PENAS DO MUNDO


Eu queria
saber escrever sobre
coisas boas,

dessas doces,
dulcíssimas que falam d’sonhos,
d’amores e d’esperanças;

dessas sem bocetas
encharcadas e sem paus hasteados
nos varais,

dessas sem pregos
afiados e sem grandes merdas derramadas
pelas estradas;

dessas que todos
gostam de ler e elogiam, por não conterem
dores nem bolores;

dessas, enfim,
que todos deixassem de dizer
que perdi a razão;

apenas por
se verem no contraverso
de seus reflexos.

PEDRAS E PERDAS


A nós dois,
que nos sobrevivemos
por tanto tempo

em cruciantes dores
e angústias, nesse estranho amor
de lâminas

– carregado de ominosas
imagens, de lancinantes chuvas
de fogo,

de severas condenações
com o verbo e de enraizados rancores
na alma –,

que nos apetece ainda
cultivar sombras sobre as superfícies
desalinhadas e pontiagudas
do mundo,

a não ser
para sedimentar a iminente morte
de nossas asas?

NÃO HÁ AMOR SEM CAOS

Sem a menor dúvida,
o maior problema que enfrentamos
durante todo o tempo em que
nos amamos,

foi termos excogitado demais
sobre nós mesmos,
e sobre o que éramos ou fazíamos
ao meio de outros passarinhos e mariposas
com seus cantos soberbos
e seus faróis acesos,

porque o amor não admite elucubrações
nem suas palavras-instrumento,
que acabam se transformando em afiadas
navalhas a tocarem a alma
e a ameaçarem a paz.

Não, não fale deles
– essa bicharada que, como nós,
regozijam luzes defecando
sombras escondidos –;

os maiores culpados
de nossa morte fomos nós mesmos,
que não soubemos nos amar
em meio a este inevitável
caos.

A SENSIÊNCIA HUMANA!

Que seria a maior virtude
– ou riqueza –
há no ser humano,
senão a razão, que o difere
das demais coisas
e animais,

que lhe permite,
entre tudo que imagina, sente ou vê,
fazer escolhas que melhor
lhe aprazem?

Não obstante,
que também maior chaga
há no universo
que a aquisição acidental
dessa racional
senciência,

que lhe permite
colocar-se ao centro de tudo,
rasgando possibilidades,
inaugurando novas casualidades
e provocando extermínios
plurais?

VIVER É NÃO PENSAR

Se as coisas não nos são
de outro modo, senão o com que as vemos
com nossas sencientes e cegas
retinas;

por que eu deveria
dar algum crédito ao que regozijam
os filósofos, os religiosos
e os demais menestréis
de plantão,

ou por que deveria
pagar algum tostão que seja,
pelo conjunto a quem chamam
de sabedoria humana?

ESTRANHA ANARQUIA!

Em que estranha anarquia
e em que abstratíssima sensação
me acordei nesta opiácea
e inusitada manhã:

sob o desdenhar das nuvens,
fora como se as coisas
estivessem se apagando
em branco,

sem que eu pudesse
compreender se eram reflexos avessos
de meu espúrio eu psíquico,
ou de minha alma
vazia.

DESEJOS

Beijos ardentes,
mãos ávidas a percorrerem o corpo,
bocas a suspirarem desejos,
pernas delineadamente sensuais
a me prenderem à vulva
a rígida haste

– as entregas, os malabarismos,
os suores, os afagos, os orgasmos:
sem nenhuma contenção,
sem nenhuma tentativa
de compreensão –;

mas há uma condição
que preciso impor tão somente
para nossa sobrevivência
de asas:

em meio a essa imperiosa
tempestade de libidinosos sentidos,
deixa o verbo amar
no intransitivo.

PERDI A COR DA NUVEM!

Perdi a cor da nuvem
em que nos abarcamos outrora,
agora sei apenas que há um corpo
sensual e faminto a andar
por aí

– entre mares sedutores,
céus promissores e pedras-de-tropeço
de todas as cores –

a se inebriar a goles
de sonhos, amores e encantos
e outros pássaros
sapiens,

com suas vesanias às mentes,
seus regozijos às bocas
e suas extasiantes espumas
às genitálias.

Sim, perdi a cor da nuvem
em ângulos e caminhos contrários,
sem nunca termos conseguido elucidar
os mistérios de nossos ventos,
chuvas e tempestades.


O QUE FAREI AGORA?

Não compreendo
isso que me sobrou agora,

é como se o sol
tivesse se posto para sempre

e aquele inverno
em que nos amamos
tivesse me envolvido e tomado conta
de todo meu corpo e minha alma;

e o pior de tudo
é que eu não sei o que fazer
e onde ir agora que tu já não estás
em lugar algum à minha
espera!

BECOS SECRETOS

Por trás
daquele olhar negro,

por trás daquele pálido
olhar de anjo,

por trás
daquele limpíssimo e sensual
vestido branco,

por detrás
daquelas asas de voos
sublimes e longos:

eu vi,
e eu senti um desejo tão
indevassável,

que sustentaria
toda uma legião de demônios!

TENS IDEIA DE COMO JÁ TE AMEI?

É magnífica a visão:
“tu tomando banho de piscine de top less
e com a pequena calcinha
enfiada atrrás;

de resto,
totalmente nua!

E eu fico dissimuladamente
te olhando e pensando no que te dizer
ou no que fazer contigo,

vendo a pequena peça
te comendo e o sol te lambendo
o corpo inteiro:

oferecer-te uma linda canção,
um poema dos melhores que já escrevi,
um jantas com uma vela em luz

out e amar urgentemente,
enquando não chegam os astutos anjos
e os famintos lobos!

CONSTATAÇÃO!

Tudo sobre ti
foi meio fantasia, meio idealismo,
meia realidade,

meia verdade,
meia mentira, meio conto
de fadas,

meio mar,
meu céu, meia floresta
meio deserto amargo;

sim, tudo sobre ti
foi meio dia, meia noite,
meia presença, meia ausência,
meio júbilo, meio silêncio.

“Vai com cuidado, Thor!”,
eu me dizia silentemente a mim mesmo:
“Tudo nela é meio luz, meio sombra
como se ela fosse uma fábrica
de sonhos e de bombas!”

A VISÃO PARA FORA DA CAVERNA É ABNÔMALA!

Voltar para a caverna,
este é meu inexorável caminho,

que outros façam
da poesia caminhos e destinos
de ilusões e de sonhos,

que outros a façam
de repercussões de imjpulsos
e de desejos ardentes
e excitantes,

que outros a façam
com palavras de amor de suas noites
de glória e insones;

eu, para escrever,
uso a pedra,

a pedra
que constitui o que nunca fui,
ou deixei de ser:
a caverna!

ESCONDIDOS ESPELHOS!

… à noite
ficam acordados os cães,

e os anjos sabem
disso de seus exilados
paraísos:

dizem que,
quando Deus adormecem,
descem escondidamente
às sombras,

onde sonham,
amam e fodem com seus espelhos
em libidinosíssimas

miragens!