sábado, 31 de março de 2018

CLARIVIDÊNCIA

Somos os reflexos
que vemos nas coisas,
com suas geometrias, cores
e valores;

a urgência das miragens,
das imagens e dos espetáculos
em fulgores;

os poemas e regozijos desbotados,
as pernas escancaradas,
os leitos alagados;

o amor, a dor,
os deuses sacrificados,
as estrelas amassadas,
o universo modificado;

sem nenhuma ordem certa,
sem nenhuma desordem aceita,
somos exatamente tudo
nada,

além do que colocamos,
espuriamente,
sob nossos faustos e sencientes
neons em ardor.

DAS COISAS

Sim, importa redimir-me
desta inocência insana,
quebrar os espelhos,
evidenciar abnormidade,

assumir as dores
da existência abstrata
- as estrelas só são vistas
porque as sombras prevalecem entre
suas distâncias –;

não importa a dor
e a angústia de me saber não-ser,
urge-me mais que isso:

urge-me a impossibilidade
de não ser.

NATUREZA UNIVERSAL


Dizei-me onde há
o sincero silêncio do verbo
e a virgem sublimidade
das coisas

– a não ser
na temida e hedionda morte
ou no ansiado paraíso
que já inauguramos
em vida –

que vos provarei,
da abstrata ponte existencial
da qual a tudo elucubramos
sencientemente,

nossa inexorável
e despercebida consubstancialidade
ao apagamento que
se nos coabita.

SONHO SECRETO

Escondi,
aos idos da infância perdida,
numa caixa enterrada entre as flores
e as frutíferas do quintal
de minha casa,

um sonho
que realmente pensei
ser inquebrável.

Após ser atingido
por cantos e encantos de sereias
e por fortes tempestades
de areia

– e o tempo me corroendo
com falésias cheias –,

fui desenterrar o valioso
tesouro:

ao abrir, dentro havia
fiapos estraçalhados o que restou
do sonho – que hão conto,
pois é segredo –,

ao fundo,
aos lados e encavalados
haviam enormes vermes,
todos obesos.

AMOR E PAIXÃO

Por detrás do fino feltro
que separa esses dois sentimentos
pode-se perceber sua principal
diferença;

por exemplo,
há beijos, abraços e embaraços
que provocam delírios
de amor e paixão:

esta sempre a exigir,
do corpo, ilustre presença;
aquele a vigorar candidamente,
mesmo em longa
ausência.

sábado, 17 de março de 2018

É O QUE FAZ A MAIORIA DOS AUTODENOMINADOS POETAS DE AQUI!

Dizer que ama alguém
só para fodê-la ou para mantê-la
sob as rédeas da egolatria
possessiva

é um dos mais
bárbaros e imperdoáveis
crimes que já vi
minha vida;

é como disparar
em dois alvos com um tiro só,
atingindo a falsa crença
do interlocutor

e a profunda sombra
do próprio cerne.

A EVOLUÇÃO HUMANA SERÁ A MAIOR TRAGÉDIA DE DEUS!

Ainda bem
que já não me surpreendo
mais com os menestréis,
com os doutores e com os velhos
puristas que habitam
os píncaros urubuzeiros:

quando eu era jovem,
diziam que minha geração
estava perdida,
e hoje repetimos o discurso
de que a nova geração
está perdida;

e nisso eles acertaram
mesmo em cheio,
porque todas as novas gerações
estiveram perdidas
no exato ponto em que
envelheceram,

porque, quanto mais estudados
e talhados a conhecimentos
e experiências de vida,
é que mais reinauguramos incautamente
as casualidades do universo,

desafiamos o poder do átomo,
criando mortais ogivas nucleares,
decidimos pela guerra quando podemos
escolher a paz,

e contribuímos,
embora os esplendes discursos
sejam sempre mantidos,
para os ominosos apartheids
entre raças e povos.

SEM TRÉGUAS

... rendo-me,
chovo fogos emcobrindo
o céu de cor negra,

sangro em noites
frias e sombrias, luto, renovo
as esperanças,

não refaço a cama
ou o sonho que a morte quis
nos desfazer;

com os tristes olhos
deste poeta niilista, que ninguém vê
resisto,

até que também
me chame a morte e nos permita
que tudo outrora por nós semeado
se conclua em grandiosa
possibilidade quântica,

distante
das imagens que nos levaria a vazios
e a nadas neste mundo de semelhantes
loucos e estranhoa que, juntos,
habitamos.

AS ESTRELAS FORAM TODAS EMBORA!

Ainda ressoam
em minha alma as tristes lágrimas
dos olhos teus

e meu coração,
nesta eterna distância que a morte
nos impôs,

tornou-se
mais frio e congelado que o próprio
habitat hiemal,

e o frio vento
que me visita batendo na janela
às madrugadas

vem consolar-me
deste tão grande amor que me dominou
e que me fez escrever nossas vidas
em poesia e em saudosas
e tristes emoções!

ETERNO APAIXONADO

... vivi-te com intensidade
no inverno, no deserto e entre as brancas
nuvens do céu,

amei-te
o corpo, a psique e a alma
em chama;

enquanto pensavas
que eu mentia, que eu dissimulava
e que eu não te amava,

mesmo agora,
a mais de um ano que partiste,
afirmo que não, e que na verdade,
hoje mais que nunca,

sei que fui
e que sou por ti um irremediável
e eterno apaixonado!

quarta-feira, 14 de março de 2018

O TEMPO, NEM O AMOR, ESPERAM DEMASIADO!

Quantas vezes
quisera eu acender contigo nossos corpos
nus sob a lua,

Quantas vezes
tentei te mostrar que a verdadeira
paz e o verdadeiro amor só acharíamos
no deserto?

Quantas vezes
Te avisei para tomares cuidado
com as intenções dos anjos que andavam
dissimuladmente por tua rua?

Quantas vezes
eu te ensinei que a luz das palavras
e dos desejos carnais era por edemais
frágeis e frias?

Quantas vezes
eu te disse que estava ficando tarde demais
e que a morte já nos espiava
atrás das esquinas?

Meu Deus! Quantas vezes,
mesmo dizendo me amares tanto,
tu realmente me ouviste?

A BELA ERA TAMBÉM UMA FERA!

Graciosa e bela,
permitiste que muitos voassem
teus céus,

e se deitassem
em teus esplêndidos leitos
de nuvens,

e te amassem
em brancas camas o corpo
nu,

nos verões
em que te insinuavas aos anjos
e aos soberbos feitos de luzes
de neon:

a mim, porém,
que tanto te amava, só me permitiste
ouvir a navalha de tua fria
palavra,

frequentar
teu rigidíssimo e enregelado inverno
morta

e me ferir
mortalmente nas afiadas pedras
de teus escondidos
chãos!

POR QUE SEMPRE ESTIVESTE CONTRA MIM?

Passada a estrada,
passado o céu,
passado o mar,

passadas as chuva,
passadas as sombras das pedras,
passado o engano do amor,

passados dos corpos
com quem nos deitamos e fodemos,
passados os sonhos que desperdiçamos
com as sombras de nós
mesmos,

passadas as nuvens que contemplávamos,
passadas as vozes que ouvíamos,
passadas as fantásticas apresentações
que presenciáramaos,

pensei que passaria,
para um pouco de alívio meu,
também por ti meu grande e imperioso
amor,

mas este não passa
mergulhando em minha maior crise,
em meus medos mais secretos e em minhas
dores, por tua perda, mais
cruciantes

e me deixando
somente a tênue esperança escura
de logo chegue o momento
de também poder me
passar!

AMOR: O PARADOXO!

No amor,
as coisas são muito piores
que nas paixões e nos avassadaroes
desejos:

é que, quando
de uma trepada em um leito,
rwgado a abraços, beijos e excitantes
trepadas,

nenhuma chuvas,
empestade ou furacão mata o que
simplesmente ali não existira: o verdadeiro
ato de amar.

Mas, quando se ama para valer,
à lindíssima flor a que amamos com o corpo,
com a mente e com a alma, até uma levíssima brisa
atravessada no meio de uma noite,
mata!

A TRAGÉDIA HUMANA

Se os animais
temem e evitam o homem, sem terem
das coisas a senciente
razão,

imaginem só
se soubessem discernir sobre o que
realmente somos
capazes?