sábado, 25 de novembro de 2017

DEZEMBRO ENCANTADO



Era dezembro. Chovia fino e constante nos meus idos de infância perdida. Minha vó fazia pirulitos puxentos, com açúcar e limão para vendermos. Também vendíamos, sob a chuva fina, ovos e verduras que pai e mãe traziam da roça. E em dias de sol, picolés em uma caixa pendurada no pescoço. Ganhava-se alguns trocados e, vez em quando, apenas riam, zombavam e saíam chupando o picolé sem pagar.

Mas vamos de volta ao dezembro de constante chuva. Eu amava dezembro com seus cheiros de plástico, com férias de escola e com a alegria de todo mundo naquele mês.

Num deles, desses dezembros, uma amiguinha minha perdera o pai. E eu pensei comigo, estou triste, mas vou aproveitar o dezembro, afinal é só um por ano e nem fui lá ver o defunto, coisa que eu fazia por curiosidade.

Uma semana depois, briguei com um amiguinho. E no trava-trava de gavetas, mãos nos pescoços, derrubei-o e montei nele. E o humilhei “Vai mexer comigo de novo, vai?”

O coitado sangrava pelo nariz e nada respondia se esperneando para sair. Outros me tiraram de cima dele e fomos embora.

Bem, mas o destino é o destino. Uma semana depois, ao descer de bicicleta uma rua com forte inclinação, trombou na trazeira de uma carroça que carregava, arrastando, ferros para construção. Ficou tão machucado pelas ferragens que, quando o fui ver, estava todo enfaixado dentro do pequeno caixão.

E eu pensei. É dezembro. É dezembro. É dezembro, poxa. E sinto o cheiro de plástico, dos presentes do papai noel. E dali me fui.

No dia de natal, ganhei um aviãozinho de plástico. Para a desgraça voar só na minha mão e com a minha mente no céu. Então pensei para que serve esse aviãozinho se sem ele posso voar mais, e o pai da minha amiguinha e meu amigo não podem nem andar mais.

Então fui tomar um banho. E descasquei a banana voando com uma mulher. Aquilo foi mágico, imaginar algo grande e peludo.

Gozei! Pela primeira vez na vida, gozei, embora não tivesse saído nada, a não ser um liquidozinho transparente. Mas o fato é que tremi e gostei.

E pensei de novo: “Caramba, que coisa boa!” Daí para frente, como sabem, é o humano cão.


E nunca mais deixei de descascar, nos banhos, a banana, com o uso da mente sobrepujando o mundo, a vida e suas trágicas contradições!

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