Nobres palavras
ressoaram de teus lábios,
sobretudo quando te postavas
perante manipuláveis
espelhos;
não obstante,
vi escorrendo de teus olhos
– que te condenaram –
mentiras em brilhos
secos.
E não é por isso
que eu deveria ter te julgado
os enredos dos verbos
e as espuriedades
das atuações
– até porque bem sei
que não é possível ao sapiens
a sublimidade plena
que ele almeja –;
mas,
se te preguei à cruz,
foi somente porque atacaste
aquele que, como tu, tem incontável
e vil pequenez
de espírito.
Escondidas
as sombras das asas
e dos corações
e lavados
os leites e as nódoas das genitálias
e das mãos,
os pássaros
sapiens colocam-se
(tersamente)
sempre prontos
e limpos para as próximas
encenações.
... e todos os toques
e esfregaços excitados, e todos os abraços
e beijos molhados, e todos os leites
e lágrimas derramados,
e todas as dádivas
de amor sublimado, e todas as luminescências
regozijadas, e todas as demais perjuras
feitas com o verbo volátil;
tudo, tudo, tudo
saiu e, ao fim, retornou do mesmo ponto:
suas almas esquálidas
e esvaziadas.
... o que faz
a sublimidade dos voos
são as invisíveis
asas:
o problema
é que sempre nos imaginamos
nos haver naqueles sem,
contudo,
tomarmos
as medidas certas e concretas
para cuidar bem
destas.
... é tempo
de se apagarem (definitivamente)
as luminescências
artificiais,
para tentarmos
nos renascer, separadamente,
em uma nova e sublime
imensidão.
... a mente
entorpecida pela cerveja,
pelo vinho e (das coisas) pela
incompreensão;
o corpo
encurvado, já quase prostrado,
ao ressequido
chão;
ao cd-player da sala,
Tchaikovsky toca algo que, há muito,
já não distingo muito
bem;
a alma
vigora antes de tudo isso
– lidando com sonhos, esperanças
e quedas constantes –
ao mesmo tempo
em que sempre se perde em meio
aos tantos e longos
desvãos.
... da imensidade
esquecida, do fogo quase apagado,
dessa quase inapagável
rotina maldita.
Sim, regressar
– como as magníficas ondas –
ao grandes e vivos
mares;
calmamente,
percorrendo todo o mapa
com suas flores
e pedras:
e somente aí,
neste ponto ter a certeza absoluta para
– em um sincero “eu te amo” –
se declarar.
Eu voltei no tempo
e no espaço para te admiriar
puerilmente,
havia em ti
muita luz misturada
com sombras:
tu uivaste
e choveste como nunca, querendo-me
como teu anjo menino,
tua mente
adornava meus pensamentos
e minhas ilusões mais extáticas
e efervecentes.
Com minha resistência,
choveste mais e fizeste colidir-me,
com tuas mãos e com tuas loucuras
uma seringa com veneno medido
à conta para não me matar,
como dizias:
silêncio,
solidão
e dores de parto cruciantes,
vieram com o veneno
que aplicaste em minha carne,
em minhas veias e em minha alma
suicida!
As luzes neon,
as maiores mentiras já pregadas
pelas retinas sapiens;
aos espelhos,
as mais belas, sublimes e leais
atuações ao membembe
espetáculo sapiens;
sob as nuvens
que acima passam despercebidas,
procissões e mais procissões de sapiens
pregando o bem e a boa
vontade:
aos lábios, porém,
não se ouve nenhuma confissão
de seus piores, mais aterradores, mais libidinosos
e mais hediondos segredos!
... para amar, como
concordo com Drumond,
em não devendo ser verbo transitivo,
deve-se ser por entre
os jardins, as flores e os espilhos que
elas contém aos caules
escondidos,
aos céus zuis,
às areias movediças e aos pantanosos
vales onde os fantasmas se abrigam
e se escondem,
na cama,
como na fama, da flama ou na lama
onde possa aparecer todo e qualquer delírio
ou desafio ao dois cúmplices
amantes!
... concordo
com Friedrish Nietzsche,
quando ele diz
que
“O que se
faz por amor, está
acima do bem
e do mal”;
não concordo,
entretanto com as dores
que provocam com ciúmes, possessividades
e agressividades
por vãs
elucubrações sobre o que
faz ou deixa de fazer
o ser amado.
... quase
às vésperas de minha partida,
liliths e nuvens
picaram
a mula e foram embora
julgando-me como se fossem
deuses:
até que
chegou alguém andando
por entre meus
despojos,
que fez,
com sua simplicidade, ternura e luz,
com que ainda me nascesse
uma última flor
incendiária!
... que somos,
senão amontoados de átomos
em abnormidades variantes
e sencientes,
e que sobre nós seja,
senão violações de casualidades,
possibilidades e silêncios
inocentes?
... depois que
os verões se enxugam
e os invernos se enrugam aos caminhos
e descaminhos
(já exaustivamente
desgastados por tantos voos,
quedas e esfregaços),
que virá após
(e depois de após) senão inícios e reinícios
de mesmos ciclos
tão cheios de vida,
tão cheios de equívocos,
tão cheios de morte?
Por isso, Pai,
mais que nos perdoar, é preciso fazê-lo
(embora doloroso) sempre
e incondicionalmente,
porque o que
mais fazemos é nos colocar
à imanente beira
do erro.